Cristina
Serra
jornalista &
escritora.

Cristina
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out 11, 2020 | Meio Ambiente

A insegurança das barragens

O Congresso aprovou e o presidente sancionou a nova política nacional de segurança de barragens de mineração. Perdeu-se uma excelente oportunidade de aperfeiçoar a fiscalização para tentar evitar a repetição de tragédias como a de Mariana, em 2015, e a de Brumadinho, em 2019.

A nova lei não alterou uma brecha crucial na fiscalização. As investigações revelaram graves suspeitas de irregularidades na elaboração dos laudos de estabilidade das barragens das mineradoras Samarco e Vale. Por que o laudo é essencial? Porque é este documento que as empresas apresentam aos órgãos fiscalizadores atestando que sua barragem está segura.

Aí temos dois problemas. Primeiro: o laudo é elaborado por auditor contratado pela mineradora, configurando uma relação comercial que pode gerar conflito de interesses. Segundo: se o laudo atesta a segurança, a barragem vai para o fim da fila da inspeção in loco. Na prática, esse sistema autodeclaratório faz com que a própria empresa determine se receberá ou não a visita dos fiscais. Nos dois casos, as empresas tinham seus laudos em ordem e deu no que deu.

A solução desse nó não é fácil. Mas o Congresso sequer enfrentou a questão. Dado o peso econômico e político das mineradoras não é difícil imaginar o porquê. É bem verdade que a nova lei aumentou o valor das multas, antes um trocado. Mas Bolsonaro vetou o trecho que destinava o dinheiro para o caixa do órgão federal fiscalizador, a Agência Nacional de Mineração, que se vê à míngua para inspecionar mais de 700 barragens.

Os dois desastres somados mataram 299 pessoas e poluíram dois importantes rios do Sudeste: Doce e Paraopeba. Daqui a menos de um mês, Mariana completará cinco anos. Os três povoados mais atingidos não foram reconstruídos e indenizações ainda são discutidas. Estudos recentes mostram altos níveis de toxicidade no rio e em sua foz, no Atlântico, com graves impactos para a saúde humana, flora e fauna. O processo criminal anda a passos de cágado e a tragédia se perpetua dia após dia.

(publicado originalmente na Folha de São Paulo em 10/10/2020)

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