Cristina
Serra
jornalista &
escritora.

Cristina
Serra
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fev 2, 2021 | Brasil

As pistas deixadas pelo miliciano

Pouco antes de morrer, o ex-policial militar Adriano da Nóbrega disse a seu advogado que temia ser assassinado como “queima de arquivo”. Dias depois, em 9 de fevereiro do ano passado, Adriano morreu em suposta troca de tiros com a polícia, ao resistir à tentativa de captura na zona rural de Esplanada (BA). A perícia revelou que ele recebeu dois tiros a curta distância.

Adriano era apontado como chefe do Escritório do Crime, grupo de extermínio que cobrava até R$ 1,5 milhão para assassinatos por encomenda. Sua história é um retrato de como o aparelho estatal, o poder político e a criminalidade se entrelaçam. Adriano foi “caveira” da tropa de elite da PM e braço armado do jogo do bicho, até ser expulso da corporação e se lançar de vez no crime.

No comando da milícia, expandiu vasta rede de negócios ilícitos, como extorsão, agiotagem, grilagem de terras, transporte e fornecimento clandestino de tv a cabo, luz e gás. Até aí, a história do ex-PM não difere da de muitos outros agentes do Estado que viraram bandidos. O que o distingue são seus vínculos estreitos com a família Bolsonaro.

O miliciano conseguiu emprego para a mãe e a ex-mulher no gabinete do então deputado estadual Flávio Bolsonaro por meio do notório Fabrício Queiroz, operador do esquema das rachadinhas. Investigações mostram também que empresas controladas por Adriano lavaram parte do dinheiro desviado.

Em sua rota de fuga, o miliciano teria passado por sete estados. Se tivesse sido capturado vivo, talvez pudesse ter esclarecido não só a rede de proteção que o manteve foragido durante um ano, como a extensa lista de crimes atribuídos a ele e a seus cúmplices.

Quase um ano depois, sua morte suscita muitas perguntas. Adriano teria sido atraído para uma armadilha ao esconder-se no sítio de um vereador do PSL? Por que temia ser morto numa queima de arquivo ? Qual o conteúdo dos 13 celulares e chips apreendidos com ele e até hoje em sigilo ? Mortos não falam, mas deixam pistas que falam por eles.

(publicado originalmente na Folha de São Paulo em 02/02/2021)

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