Cristina
Serra
jornalista &
escritora.

Cristina
Serra
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escritora.

fev 11, 2021 | Jornalismo

A praga do jornalismo lava-jatista

Quando começou, em 2014, a Lava Jato gerou justificadas expectativas de combate à corrupção. Revelou-se, no entanto, um projeto de poder e desmoralizou-se em meio aos abusos e ilegalidades cometidas por Moro, Dallagnol e a força-tarefa.

Além de afrontar o ordenamento jurídico e ajudar a corroer a democracia, a Lava Jato também corrompeu e degradou amplos setores do jornalismo; em alguns casos, com a ajuda dos próprios jornalistas, como a Vaza Jato já havia mostrado e agora é confirmado nas conversas liberadas pelo ministro do STF, Ricardo Lewandowski.

Relações promíscuas entre imprensa e poder não são novidade. No caso da operação, contudo, as conversas mostram que repórteres na linha de frente da apuração engajaram-se no esquema lava-jatista e atuaram como porta-vozes da força-tarefa, acumpliciados com o espetáculo policialesco-midiático.

Jay Rosen, professor de Jornalismo da Universidade de Nova York, cunhou o termo “jornalismo de acesso” para definir como jornalistas sacrificam sua independência e abandonam o senso crítico em troca do acesso a fontes, que passam a ser tratadas com simpatia e benevolência. A Lava Jato é um caso extremo de “jornalismo de acesso”, em que repórteres aceitaram muitas convicções sem as provas correspondentes.

Colaboraram com o mecanismo de delações e vazamentos seletivos, renunciaram à obrigação ética de fazer suas próprias investigações e fecharam os olhos para os métodos da força-tarefa. Nas empresas, tiveram retaguarda. O jornalismo corporativo participou abertamente do projeto lava-jatista.

Em março de 2016, por exemplo, Moro vazou o conteúdo do grampo ilegal que captou conversas entre a então presidente Dilma Rousseff e o ex-presidente Lula. O grampo foi reproduzido por TVs e jornais, que se tornaram coautores da ilegalidade. A relação pervertida entre poder e imprensa fere a dignidade da profissão. É uma praga a ser sempre evitada e combatida.

(publicado originalmente na Folha de São Paulo em 09/02/2021)

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