A história do Brasil é tão associada à exploração predatória de recursos naturais que nosso gentílico - brasileiro - designava quem trabalhava na derrubada do pau-brasil, “a ferro e fogo”, como bem definiu o historiador Warren Dean. A extração da madeira - que fornecia a tintura cor de brasa para tecidos na Europa - foi o motor inicial de uma devastação que explica muito do persistente “correntão” nas nossas florestas.
Da Mata Atlântica original, que se estendia por 17 estados brasileiros, restam apenas 11,73%, segundo o botânico Ricardo Cardim, que se dedica a localizar as árvores gigantes remanescentes no bioma. Há poucos dias, Cardim divulgou a descoberta, no sul da Bahia, de um tesouro: o maior exemplar de pau-brasil encontrado até hoje, com idade estimada entre 500 e 600 anos. Um raríssimo sobrevivente do saque ecológico de cinco séculos.
Esse achado alvissareiro vem no momento em que a ONU se prepara para dar início à Década da Restauração de Ecossistemas (2021-2030) no mundo inteiro. No Brasil, coletivos de ongs que trabalham na conservação da Mata Atlântica se associaram à iniciativa de forma a refletir sobre duas tragédias que vivemos. A pandemia já matou mais de 180 mil brasileiros e o ataque aos ecossistemas empurra cada vez mais, não só a Mata Atlântica, mas também o Pantanal e a Amazônia, a um patamar de destruição próximo do irreversível.
A campanha “Bosques da Memória” ( www.bosquesdamemoria.com ) já começou o plantio de uma árvore para cada brasileiro que morreu de covid-19. Seus nomes serão eternizados nos vários bosques pelo país. Um gesto de solidariedade para transformar dor em esperança e promessa de vida. O compositor Aldir Blanc, por exemplo, foi homenageado com uma goiabeira branca, árvore da sua infância e sobre a qual escreveu em poemas e crônicas. Como diz a canção dele e de João Bosco, “uma dor assim pungente, não há de ser inutilmente…”
(publicado originalmente na Folha de São Paulo em 15/12/2020)
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